Equilíbrio fiscal para avanço do País

Os dados da nossa balança comercial, no ano passado refletem bem o impacto do Custo Brasil na competitividade da indústria de transformação, sem dúvida o setor mais afetado. Apesar de o País ter alcançado um superávit comercial recorde de US$ 61 bilhões, a balança dos produtos manufaturados apresentou déficit de US$ 53 bilhões, reflexo de uma concentração crescente da nossa pauta de exportações em bens primários.

A recuperação da competitividade da economia, em setores em que não temos vantagens comparativas internacionais naturais, mas que têm potencial elevado de contribuir para o aumento da produtividade, passa necessariamente pela redução do Custo Brasil. E isso não requer reformas microeconômicas e macroeconômicas, em complemento ás já implementadas nos últimos seis ou sete anos. Avançamos pouco no aumento da eficiência do Estado, o que deixa obeso, caro e fraco. Precisamos de um poder público forte, a serviço da sociedade, e não de si próprio.

É importante reconhecer que o nosso equilíbrio fiscal há muito também é pressionado pelos chamados custo tributários, que são renúncias fiscais que beneficiam setores ou empresas específicas. O Brasil precisa desenvolve um grande esforço para tornar a economia mais competitiva e não subsidiar uns ou outros, mais próximos ao poder ou com maior capacidade de lobby, porque isso significa desviar recursos que poderiam ser investidos para eliminar gargalos do país beneficiando a todos.

Não desmerecendo a importância dos esforços para preservar empregos, a renovação recente do benefício da desoneração da folha para os conhecidos 17 setores é exemplo típico, em prejuízo de outros que empregam tanto quanto, mas não tem a mesma capacidade de pressionar o Congresso Nacional. No fundo, são os parlamentares apontando quem deve vencer, e não as forças do mercado. É torcer para não quererem resgatar os campeões nacionais.

Publicado no Jornal do Comércio – Porto Alegre/RS.

Um Estado com menos gordura e mais musculatura

A reforma administrativa que tramita no Congresso Nacional é uma oportunidade para modernizar o Estado, desengessando-o, criando ferramentas que permitam valorizar os bons servidores, estimulando e reconhecendo o bom desempenho, a exemplo do que vem fazendo diversos países, inclusive vizinhos nossos como Chile e Colômbia. Como bem alertou o deputado federal Tiago Mitraud, líder da Frente Parlamentar da Reforma Administrativa: “A baixa produtividade e a competitividade do país. Aprovando a reforma, vamos ver melhorias significativas no setor público e na produtividade do país como um todo”. Segundo o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, o funcionalismo e a Previdência Social, mesmo após a reforma de 2019, são as duas contas que apresentam as maiores oportunidades para reduzir o gasto público, uma vez que representam cerca de 80% da despesa do Estado contra uma média de 50% a 60% em outros países.

Para remunerar 11,5 de servidores públicos federais, estaduais e municipais, o Brasil gastou R$944 bilhões, em 2018, equivalentes a 13,4% do PIB, um dos porcentuais mais altos do mundo. Os Estados Unidos, por exemplo, gastaram 9,2% do PIB para remunerar 22 milhões de servidores. A Alemanha gasta 7,5%, a Colômbia 7,3% e a Coréia do Sul 6,1%. Em contrapartida, no fim de 2019, a OCDE divulgou relatório de avaliação da administração pública em 44 países, com a percepção da população sobre os serviços públicos. O Brasil aparece mal na foto. Na educação, apenas 51% de cidadãos satisfeitos contra 66% na média da OCDE e 70% na China, por exemplo. Na saúde, aparecemos com 33%, a China com 69% e a média da OCDE com 70%. Os dados mostram que o país gasta muito e gasta mal, o que reforça a necessidade de mudanças.

Além do alto custo da máquina pública, existem claras distorções a recomendar mudanças. Como a existência de um quadro de 15,5 mil funcionários que custam R$1,6 bilhão ao ano, para administrar a folha de salários da União. Ou aberrações decorrentes do engessamento da grade de carreiras públicas, que obriga a manter servidores desocupados em funções obsoletas como discotecário, operador de videocassete, operador de telex, especialista de linotipo, datilógrafo, entre outras.

O Brasil não pode mais postergar uma reforma administrativa que permite ao país criar uma máquina pública forte, enxuta e ágil, capaz de apoiar e estimular o crescimento. É possível reduzir o número de carreiras na administração federal de 300 para cerca de 20. E é preciso diminuir os salários de início de carreira e estender o prazo para alcançar o teto, tomando por base o que paga o setor privado. A estabilidade deverá ser restrita às atividades exclusivas de Estado, como diplomatas e policiais.

Como bem destacou Allan Falls, um dos principais coordenadores das reformas que resgataram a competitividade da Austrália no fim do século passado e início deste, é preciso manter aceso o senso de crise para que as mudanças aconteçam. Além do sempre importante senso de urgência. Com a palavra o Congresso Nacional.

Publicado no jornal Correio do Estado/Campo Grande-MS

O Brasil pode dispensar a indústria?

De tempos em tempos, volta a discussão sobre a conveniência de proteger a indústria nacional. De um lado, altos impostos de importação estariam desestimulando a busca da eficiência, e de outro, o elevado Custo Brasil estaria dificultando a competitividade da indústria de transformação. Excluindo alguns setores e empresas, que pela histórica proximidade com o poder, têm conseguido preservar privilégios — inclusive generosos incentivos fiscais, que do lado das contas públicas são classificados como gastos tributários e consomem mais de 4% do PIB —, a indústria de forma geral é fortemente penalizada pela falta de competitividade sistêmica do país. Por um Custo Brasil que, de acordo com a Confederação Nacional da Indústria (CNI), consome 22% do PIB e obriga as empresas brasileiras a gastarem R$ 1,5 trilhão a mais para desenvolver seus negócios. A Anfavea, por exemplo, que representa as montadoras de veículos, apresentou um estudo em 2019 indicando que produzir carros no México é 18% mais barato do que no Brasil.

Infelizmente a indústria vem perdendo participação no PIB brasileiro de maneira acentuada. Em 1985, representava 48%. E a indústria de transformação, em particular, responsável por 90% do investimento empresarial em P&D, que representou mais de 30% do PIB, em 2009 já havia caído para 15% e hoje está na faixa dos 10%. Ao contrário do Brasil, a média mundial vem crescendo e está em 17%. Por isso também a participação do Brasil na produção mundial da indústria de transformação caiu de 3,43% em 1995 para 1,8% agora. Enquanto a produção industrial mundial cresceu 3,2% a.a. entre 2010 e 2018, a brasileira encolheu 2,1% a.a. O superávit comercial da nossa indústria, que subiu de US$ 29,8 bilhões em 2006 para US$ 48,7 bilhões em 2011, transformou-se em déficit de US$ 63 bilhões em 2014 e US$ 35,3 bilhões em 2020. Na década de 80 o nosso parque industrial era mais forte do que o da China. Em 1980 o Brasil exportou US$ 9,028 em manufaturados contra US$ 8,712 da China. Em 2020, esses números foram respectivamente US$ 60,7 bilhões e US$ 2,47 trilhões!

Avaliações superficiais apontam simploriamente ser normal a queda da participação da indústria no PIB em função do crescimento do setor de serviços. Diversos estudos demonstraram, todavia, que os exemplos de países com histórias de crescimento mais consistente indicam alguns padrões para essa mudança no peso relativo dos setores. Primeiro, que essa inversão ocorre quando as nações alcançam determinado nível de renda per capita, de pelo menos US$ 20 mil, quando uma população com poder aquisitivo crescente começa a consumir serviços como turismo, lazer, informação, financeiro, saúde privada, entre outros, com maior valor e tecnologia agregados, o que evita uma precarização e queda de produtividade da economia. Segundo, que essa queda acontece no formato de uma curva que dificilmente tem inclinação superior a quarenta e cinco graus. No Brasil a redução da indústria desenhou uma curva que ficou mais próxima dos noventa do que dos sessenta graus. Tivemos uma desindustrialização prematura e rápida, com parte importante do espaço sendo ocupado por serviços de baixa qualidade, com pouca tecnologia, pagando baixos salários, e por um refortalecimento do setor primário, denominado reprimarização da economia. Isso significa que o Brasil não permitiu que a indústria, especialmente a de transformação, cumprisse o seu papel no processo de desenvolvimento do país, trazendo como consequência o enfraquecimento dos setores de alta e média-alta tecnologia antes de superarmos a armadilha da renda média. O que gerou um desestímulo à qualificação da mão de obra, um atraso na evolução para os modernos padrões de produção – a indústria 4.0, a estagnação na produtividade da economia e os crescimentos erráticos do nosso PIB nos últimos anos. Paulo César Morceiro, pesquisador da FIPE, que estudou o assunto, faz o alerta: recuperar o crescimento para uma taxa na média mundial ou acima requer uma indústria com maior protagonismo.

É preciso lembrar que a indústria, em especial, foi vítima de políticas econômicas equivocadas ou mal sucedidas, que levaram à desindustrialização: na década de 1980, a década perdida, com a hiperinflação e a crise da dívida, e nos anos 1990, com o câmbio valorizado e os juros mais elevados do planeta. Esses fatores impediram a indústria brasileira de acompanhar as transformações tecnológicas em curso em outros países. Ao mesmo tempo em que um consistente aumento de gastos públicos foi fortalecendo outros componentes do Custo Brasil, minando a competitividade da economia do país e das suas empresas. Fatores influíram, como: alta carga de impostos; sistema tributário mais complexo do mundo, apropriadamente chamado de manicômio tributário; burocracia paralisante e serviços públicos de baixa qualidade; e infraestrutura absolutamente insuficiente.

Todas essas variáveis recomendam que a avaliação sobre o papel da indústria não pode ser uma discussão leviana sobre privilégios, por mais que em casos isolados isso realmente ocorra. Simplesmente baixar tarifas para aumentar a abertura da economia brasileira não aumenta a competitividade. Seria muito fácil. Como o próprio ministro Paulo Guedes afirmou em 2019, temos que substituir o conceito “abertura”, com redução unilateral de tarifas de importação, por “inserção”, muito mais amplo, envolvendo discussões sobre reformas, desburocratização, alinhamento de regras comerciais com outros países e blocos econômicos, mecanismos de promoção comercial e outros pontos que tirem as amarras das empresas. Quem sabe assim ainda consigamos resgatar a imprescindível contribuição que a indústria brasileira poderia e gostaria de dar ao processo de desenvolvimento do país.

*Empresário, um dos idealizadores do Movimento Brasil Eficiente (MBE), membro do Conselho Superior de Economia da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e do Conselho Empresarial da América Latina (Ceal).

Publicado na Revista Amanhã.

Estado a serviço da sociedade

Que precisamos seguir no caminho das reformas, se quisermos criar as bases para um crescimento consistente, é entendimento generalizado. A discussão é mais em torno do conteúdo delas, e da ordem. A tributária e a administrativa são prioritárias. Na tributária, temos dois aspectos que precisam ser revistos: a complexidade e a alta carga de impostos.

A estrutura de impostos brasileira tem sido, apropriadamente, chamada de manicômio tributário. Segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), uma empresa no Brasil precisa estar atenta a 4.078 normas, compostas por 45.791 artigos e 106.694 parágrafos, para procurar atender às obrigações fiscais. Somando as instâncias federal, estadual e municipal, obriga empresas que atuam em todo o país a observar até 400 mil leis, decretos, medidas provisórias, portarias, instruções normativas e atos declaratórios. O Brasil é de longe o campeão mundial em horas necessárias ao cumprimento das obrigações fiscais, o que consome em média 1,5% do faturamento anual das suas companhias, e impõe um custo total estimado de R$ 65 bilhões. Com a aprovação do Simples há alguns anos para micro e pequenas empresas, consolidou-se o complicado para os outros. Deixou mais explícita a necessidade de descomplicar tudo. As duas propostas que tramitam no Congresso (PEC 45 e PEC 110), apesar de trazer mudanças importantes, preveem um período de transição longo, o que significa que o que é complicado ficará ainda pior durante o longo período de convivência do complicado anterior com o novo sistema.

Essa simplificação é importante e urgente porque a confusão existente hoje reduz a produtividade da economia e assusta o investidor estrangeiro. Quanto à igualmente importante questão da alta carga tributária no país – a mais alta entre as nações em desenvolvimento –, ela deve ser precedida da redução do custo da máquina pública. Nenhum gestor vai abrir mão de arrecadação enquanto não cair a necessidade de recursos para o funcionamento da respectiva unidade federativa. E é aí que entra a reforma administrativa. Não se discute Estado grande ou pequeno. E sim, Estado forte ou fraco, com musculatura ou gordura, eficiente ou ineficiente. O que não depende de tamanho, e sim de qualidade. A qualidade do gasto fará a diferença, inclusive para deixarmos o pódio de pior relação do mundo entre impostos arrecadados e qualidade dos serviços prestados à população.

E isso não é de agora. Já dura duas décadas. Nos anos 90, tínhamos carga tributária de 25% do PIB, e conseguíamos investir igual percentual, dos quais 5% em infraestrutura, uma boa parte investimento público. Hoje, a carga flerta com os 35%, e o investimento não passa mais dos 15%, sobrando menos de 1% para a infraestrutura, o que não cobre nem a depreciação do estoque, acentuando o custo Brasil. O Estado cobra cada vez mais e consegue investir cada vez menos. De outro lado, o consumo do governo dobrou, chegando a 20% do PIB. Significa que o poder público extrai parcela crescente da riqueza da sociedade para manter uma máquina obesa, muitos programas de transferência de renda ineficazes (não se refere aqui àqueles que funcionam e até são referência, como o Bolsa-Família) e gastos tributários para atender grupos de pressão. A sociedade paga conta alta para beneficiar corporações públicas e privadas e recebe cada vez menos de volta, com honrosas exceções como o excelente serviço que vem prestando o SUS durante a grave pandemia que assola o país. São as exceções confirmando a regra.

As reformas são necessárias para que o Estado deixe de ser um fim em si mesmo e volte a servir à sociedade, a desenvolver mais programas sociais eficientes e a criar as bases para um crescimento sustentado, com criação de oportunidades adequadas, a melhor forma de promover a justiça social. Não é aumentando a tributação de alguns para dar a outros que resolveremos isso, pois todos já pagam tributos demais no país, exceto aqueles que têm privilégios. A melhor qualidade do gasto público permitirá reduzir a carga tributária, que deverá beneficiar inicialmente os que hoje pagam proporcionalmente mais. Assim, também não desestimularemos investimentos e as famílias que há décadas vêm poupando para criar empresas familiares fortes, certamente um dos pilares da diversificada estrutura econômica do país.

Publicado no Estado de Minas.

O caminho saudável para fugir da crise fiscal

Estudo do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) indicou que o desperdício de recursos públicos no Brasil foi de 4% do PIB (US$ 68 bilhões) em 2019. É o que nos falta para os investimentos que fariam toda a diferença para o crescimento do país, sem gerar risco fiscal. O economista Márcio Garcia aponta que, ao longo do tempo, várias medidas procuram conter o contínuo avanço do gasto público, com destaque para a Lei de Responsabilidade Fiscal e o Teto dos Gastos, e que agora “tais controles estão fazendo o sistema ranger, sob a fortíssima pressão política por mais gastos”.

O ano de 2020 foi absolutamente atípico e exigiu gastos inéditos para fazer frente a uma pandemia que praticamente paralisou planeta. O Brasil foi um dos países que mais gastou com a proteção aos mais vulneráveis e à preservação de empregos, em linha com os países desenvolvidos, e por isso também teve uma retração do PIB menor do que o esperado. E esse nível maior de gastos também permitiu uma forte recuperação da economia no segundo semestre, especialmente de setores ligados à produção de bens duráveis, intermediários e farmacêuticos, e serviços ligados à saúde.

Esse aumento de gastos do governo, todavia, levou ao forte crescimento da dívida pública, que chegou a 89,3% do PIB, e a um déficit primário de R$ 743 bilhões. E essa conta que foi criada precisa ser paga, ou por aumento de carga tributária, que a sociedade não aceita mais, ou por uma trajetória explosiva da dívida pública, que certamente comprometeria o crescimento e nos levaria a um passado de má lembrança, ou por um caminho saudável, que permitiria manter baixas taxas de juros, aumento de investimentos e do emprego, que é o das reformas, somado ao controle dos gastos correntes e obrigatórios do Estado, e dos gastos tributários. E há espaço para esse enxugamento, considerando que a máquina pública custa hoje 20% do PIB, num momento em que o governo não tem recursos para investir, e presta serviços de terceiro mundo à sociedade. A velocidade do programa de vacinação potencializa o processo de recuperação.

Publicado no ND Mais.